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Foto do escritorIvan Motosserra Pamponet

Rock




Infelizmente a correria do dia a dia me ausentou dessa coluna nas últimas semanas. Havia planejado alguns textos temáticos referentes às datas específicas, mas não pude terminar nos períodos programados. Porém manterei a programação e ainda abordarei esses temas que pretendia explorar. E, por proximidade temporal, homenagearei o Dia Mundial do Rock (13/07) fazendo uma trajetória histórica abordando os seus principais subgêneros.


Tudo começou no fim dos anos 1940s e começo dos anos 1950s nos EUA numa mistura de Blues, Gospel, R&B, Jazz, Folk, Boogie-Woogie, Ragtime e Country principalmente em guetos negros nos grandes centros urbanos. Basicamente o Rock ‘n’ Roll é um Blues com influência de Country com uma banda de Jazz Jump Blues (uma Big Band/Orquestra de Jazz reduzida) com vocais de R&B e Gospel. Para entender melhor sua origem, eu recomendo um livro já citado antes, História Social do Jazz, do historiador judeu Eric Hobsbawn que narra a trajetória temporal e especial (no sentido geográfico) não só do Jazz, mas do povo negro e suas manifestações culturais como Blues, Gospel e Rock ‘n’ Roll. Existem alguns pontos bem interessantes que merecem serem mencionados para um melhor entendimento dessa origem como a base comum do Gospel com Country Blues e Country Folk, assim como suas variações devido ao fluxo migratório da população negra dos EUA do Sul para o Norte, sobretudo o trajeto subindo o delta do rio Mississipi, entre a segunda metade do século XIX e a primeira metade do século XX.


Apesar de já ter mencionado alguns fatos aqui antes, irei repetir algumas informações. A primeira delas é sobre a origem que muitos atribuem a Elvis, mesmo o próprio tendo tido que nunca criou nada. Ouvintes com olhar mais minucioso atribuem aos negros, o que está correto, mas muitos acabam cometendo pequenos erros ao apontar supostos criadores como Chuck Berry e Little Richard. Sem dúvida que a mídia criou uma imagem do Rock branco que se perpetuou no senso comum de maneira geral e é importante dar destaque a ícones que não foram nomeados reis por uma questão racial midiática. Contudo, os primeiros registros do Rock ‘n’ Roll foram de Sister Rosetta Tharpe que utilizava o Blues com distorção pesada -para época- na guitarra num ritmo mais acelerado em suas músicas Gospel. Suas músicas influenciaram todos os grandes nomes do gênero em sua primeira geração.


Como já homenageei Sister Rosetta Tharpe em outro texto, escolhi Little Richard para representar a primeira fase do Rock, o Rock ‘n’ Roll. Se você não conhece Little Richard, você não conhece o Rock ‘n’ Roll. Esse gênio cheio de energia é um marco musical sendo um dos maiores nomes do gênero. Nascido na Georgia em 1932 numa família religiosa com doze filhos e pais membros importantes da Igreja Batista -seu pai era pedreiro e também contrabandista de moonshine nas horas vagas-, Little Richard teve contato com a música Gospel desde criança, porém sua família tinha restrições com outros tipos de música como R&B tidas como “do diabo”. Mas em 1949 Little Richard sai da casa de seus pais para se dedicar a carreira musical, sendo que já havia começado em 1947. Foi justamente em 1947 que Sister Rosetta Tharpe ouviu o jovem de quatorze anos - Little Richard- cantando suas músicas e o convidou para abrir seus shows. Importante frisar que ele não saiu de casa simplesmente para seguir sua carreira musical, mas sim pelo falo de ser tido como homossexual por seu pai que o batia e castigava por isso, o que acabou expulsando de casa aos quinze. Desde criança sempre teve trejeitos femininos e andava mais com garotas, mas relatou se envolver com homens e mulheres ainda na adolescência, mesmo seus relacionamentos serem majoritariamente com mulheres. Em 1950, fazia apresentações como Drag Queen e com incentivo do músico Billy Wright, que era homossexual, estabeleceu seu visual marcante com cabelos compridos, roupas estravagantes e maquiagem. Inclusive a banda toda se maquiava. O que ajudava, de certa forma, a se inserir no circuito musical branco, pois, segundo ele, os brancos não se preocupavam dele querer algo com as garotas brancas.


Entre os maiores sucesso de Little Richard estão “Tutti Frutti”, “Long Tall Sally” e “Lucille”. Sem esse monstro da música o Rock seria completamente diferente e grandes nomes como Beatles, Rolling Stones, Creedence, Motorhead e outros jamais existiriam, ou se existissem, seriam completamente diferentes. A música que eu escolhi dele não foi por causa dele, mas sim por causa do Creedence que fez uma ótima versão de uma música que já era incrível.


Little Richard - Good Golly Miss Molly



No mesmo texto que falo sobre Sister Rosetta, eu falo sobre essa que é uma das minhas cantoras favoritas, a rainha do Rockabilly, Wanda Jackson. Ela é uma mistura perfeita de Elvis, Jerry Lee Lewis e Johnny Cash numa mulher conseguindo caminhar entre Rock ‘n’ Roll, Rockabilly e Country Rockabilly é uma das primeiras variações do Rock ‘n’ Roll incorporando mais elementos do Country e alguns elementos de Bluegrass. Originalmente, trata-se de um subgênero com a banda mais simplificada composta por um vocal que geralmente toca guitarra ou violão, um baixo acústico e bateria, mesmo esse último não sendo obrigatório. Muitas das primeiras gravações atribuídas ao subgênero tinham bandas compostas por três membros com um vocalista que toca violão, um guitarrista e um baixista que faz a marcação de tempo através de uma linha quase que percussiva da forma de se tocar o baixo (Slap e pizzicato) cujo bater de cordas produz um som que marca o tempo e a batida, muitas vezes substituindo a percussão. Quando há bateria, o que foi se tornando o mais comum com o tempo, é uma bateria reduzida muitas vezes compostas só de caixa, bumbo e um prato. Seu nome vem da junção de Rock com Hillbilly (termo popular para pessoas que moram na zona rural ou montanhosa de forma rústica, muitas vezes usado de forma pejorativa, seria o equivalente ao nosso “caipira”) evidenciando suas raízes. Muitos dos grandes artistas do Rock “n” Roll da década de 1950s começaram, passaram ou flertaram com Rockabilly. Jerry Lee Lewis, Carl Perkins, Elvis, Buddy Holly, Bill Halley, Johnny Cash, Gene Vincent, Eddie Cochran e Wanda Jackson foram os principais nomes desse estilo em sua primeira geração. Porém, mesmo sendo forte no começo da década de 1960s, o subgênero entrou em declínio no meio pro final da década com a ascensão de outros subgêneros como o Rock Psicodélico e a invasão britânica. A própria Wanda Jackson se dedica ao Country em meados da década, mas sem esquecer suas origens “roqueiras”. Mas no fim da década de 1970s houve um movimento de resgate do estilo com novas bandas junto a um público que adota o estilo anos 1950s de forma mais caricata. Nessa mesma época também surge os chamados Psychobilly com influências de Punk e, as vezes, até de Metal assim como uma estética mais agressiva e exagerada com elementos de terror em alguns casos.


Wanda Jackson – Hot Dog That Made Him Mad



No fim da década de 1950s e começo de 1960s surgem novas variações de Rock através da experimentação sonora. Pode-se dizer que o Surf Music seria o irmão mais novo do Rockabilly que largou a roça para curtir uma praia. Tudo bem que o Surf Music não se resume a somente uma forma, mas eu diria que, pelo menos na época, existiam três variações desse subgênero. Primeiro o clássico, agressivo e viajado Surf clássico com bandas instrumentais cheias de reverbe, delay, eco e, mais para frente, fuzz com exemplos de Dick Dale, Link Wray e The Ventures. Havia também um Surf mais calmo, bonitinho, viajado e diria até melódico como Santo&Johnny - parece que você está curtindo férias na fenda do Biquini (do Bob Esponja) -, o que julgo extremamente relaxante, mas não tão empolgante quanto o primeiro exemplo. E, o que menos gosto, Surf vocalizado que surgiu na costa Oeste dos EUA com Beach Boys e Jan and Dean que além de introduzirem harmonias vocais, diminuíram a velocidade e até flertaram com o Psicodélico mais para o final da década. Esse subgênero foi tão importante para cultura Pop que vemos presente na música tema do 007 ou do seriado dos anos 1960s do Batman. Para quem não sabe, em 2015 três grandes amigos meus formaram uma banda de Surf Music com influências de Punk, Garage, ritmos latinos como Salsa, Rockabilly e trilhas sonoras de filmes de espionagem e terror, chamada Ivan Motosserra Surf & Trash e com o tempo eu me tornei dançarino, percussionista, “cantor”, produtor e performances estranhas.


Dick Dale – Hava Nagila



No começo da década de 1960s houve a explosão de bandas britânicas, principalmente inglesas, tocando a sua própria forma o Rock ‘n’ Roll. Inicialmente inspirados nos grandes nos dos EUA nos anos 1950s como Chuck Berry e Elvis, essas bandas ganharam suas próprias roupagens. Não se modificou somente na música, mas na estética e no comportamento. No começo dos anos 1960s, a Inglaterra tinha dois principais grupos de subculturas ligados à música que eram os Mods e os Rockers (Greaser ou Teddy Boys). Os Rockers adotavam um visual mais Rockabilly com jaquetas de couro, topetes (as vezes cabelo e barba grande), botas de caubói com bainha dobrada, costeletas e motos grandes ou carros V8 típicos do EUA. Os Mods eram mais modernos e ligados às novas bandas britânicas e sua nova forma de tocar, usando roupas pomposas e chiques reformadas de outras décadas como ternos coloridos e camisa com babados, assim como cabelos de cuia ou bem arrumados, jaquetas militares de aviação antigas e motos Vespas (Scooters) com muitos retrovisores...bem mais arrumadinhos, mas tão rebeldes quanto. Por mais que eu goste musicalmente dos dois grupos, eles se odiavam e ocorreram diversos confrontos físicos violentos pelas ruas inglesas.


Como havia dito, da mesma maneira que o Rock se proliferou entre os jovens britânicos que inicialmente imitavam os EUA, em pouco tempo já produziam sua musicalidade de forma mais autêntica. E com essa autenticidade, novas experimentações musicais e um bocadinho de marketing surge a chamada Invasão Britânica que foi um verdadeiro sucesso cultural e comercial invadindo as rádios e lares do mundo todo, mas principalmente dos EUA. Curioso é que o EUA influenciou os britânicos que posteriormente influenciaram o EUA (e o mundo). Certa vez eu ouvi uma fala que fez muito sentido em relação a isso que era “o sonho de todo musico branco dos EUA é tocar como um músico branco da Inglaterra, mas o sonho de todo músico branco inglês é tocar como um negro americano”. E podemos observar isso em bandas como Beatles, Rolling Stones e Animals que tinham como seus maiores ídolos músicos negros de Blues e Rock, assim como também regravaram diversas de suas músicas.


Muita gente adora a velha discussão entre Beatles e Stones. Pra falar a verdade, eu acho uma discussão chata e sem sentido que nunca leva ninguém a lugar nenhum. Claro que a pessoa tem direito de preferir uma, outra ou nenhuma, mas essa coisa de querer provar que tá sempre certo numa questão que é meramente baseada em opinião e gosto particular é insuportável. Se a gente analisar criticamente, as duas bandas têm seus méritos e são muito boas, tecnicamente falando. A pessoa pode não gostar, mas não pode negar a importância delas. Porém eu não fico nem com uma e nem com outra, pois dessa safra eu sempre vou preferir The Who. Essa é a minha banda favorita desse período musical e sempre será. Entre as bandas dessa época, podemos considerar o The Who como a mais agressiva e rebelde, mesmo também possuindo músicas bonitinhas. E, pode ser só minha opinião, mas acho que tem a melhor cozinha (baixo e bateria) da época sem desmerecer Roger Daltrey, que é um vocalista maravilhoso, e Pete Townshend, que é um bom guitarrista e um excelente compositor, mas nunca vi ninguém na bateria como Keith Moon e John Entwistle é um dos meus baixistas favoritos. Eles são geniais e responsáveis não só por ótimos álbuns que se enveredaram por vários estilos ao longo dos anos, mas também fizeram dois filmes musicais inspirados em seus álbuns, Tommy e Quadrophenia, duas Óperas Rock que viraram filmes fantásticos. Assim como Beatles e Stones, eles influenciaram muito a música no geral e até estilos que não tem nada a ver com o deles (ou tem) como no caso do Punk. Inclusive pode-se dizer que Pete Townshend e Keith Moon que criaram o hábito de se quebrar instrumentos em shows.


The Who – Substitute


Também surgido no fim dos anos 1950s e início de 1960s, vem o Garage Rock que se pode dizer que seria um pré-Protopunk assim também como um pré-Hard Rock. De certa forma a sonoridade é muito mais crua e bruta, mais agressiva e enérgica. Mas, ao mesmo tempo, não significa que o som foi simplificado, mas sim expandido. Incorporaram outros elementos ao básico da guitarra, vocal, baixo e bateria trazendo órgãos elétricos e metais (importante frisar que não necessariamente). A ideia do nome vem de jovens montando bandas experimentais na garagem de casa e fazendo um som que exprimia seus sentimentos cada vez mais revoltados.

Bom lembrar que o Rock era marginalizado antes de ser aceito pelo mercado. Existia uma associação com rebeldia, delinquência, agressividade, transgressão de valores, ruptura com a moral vigente, sensualidade, liberdade e etc. (por isso não faz muito sentido “roqueiro” conservador). O próprio Elvis afrontava a família tradicional da época com seu rebolado e seu ar sedutor; as danças eram agressivas e sexuais demais para época; havia liberdade (dentro de certos limites) para os jovens e, o que mais chocava, para mulheres; existiam negros e brancos se relacionando e frequentando os mesmos espaços. No fim da década de 1940s surge o movimento de contracultura e pós-moderno chamado Beatnik que já contestava os valores morais, a sociedade da época e o sistema capitalista e esse movimento só foi ganhando força com o tempo até resultar no movimento Hippie da segunda metade da década de 1960s. Mas toda essa rebeldia e agressividade herdada das décadas anteriores só fizeram crescer e se desenvolver nos anos 1960s. Ainda mais que se acirra a luta pelos direitos civis e fortes críticas a Guerra do Vietnã -lembrando que a Guerra da Coreia não teve tanto impacto social.

Das bandas de Garage Rock, a que eu mais gosto é The Sonics. Banda formada no estado de Washington em 1960 que representa muito bem o que é esse estilo e pavimentou a estrada que levou ao Punk.


The Sonics – Strychnine



Eu até pensei em escrever sobre o Folk Rock tão importante nos anos 1960s, mas lembrei que tem um texto falando só sobre isso. E parando para analisar, dessa época, até onde sei, foi o gênero que mais teve judeus de destaque. Mas eu vou pular esse subgênero e continuar a trajetória.


Vou falar sobre uma das minhas bandas favoritas de todos os tempos. Uma das bandas mais Rock ‘n’ Roll que já existiu e uma das bandas que mais soube resgatar os elementos tradicionais que forjaram o Rock. Ninguém dessa banda era judeu, mas a sua gravadora, a Fantasy Records, foi fundada por dois irmãos judeus, Max e Sol Stanley Weiss em 1949, e contava com Saul Zaentz como produtor da banda. Essa banda unia o Rock ‘n’ Roll com elementos de Folk, Blues, Country e Blue-Eyed Soul (Soul branco) que acabava resultando em Roots Rock (reincorporação e intensificação dos gêneros originais que formam), Southern Rock (características mais sulistas, mais interioranas) e Country Rock. Sua primeira formação foi em 1959 quando os integrantes ainda eram adolescentes e chegaram a gravar três Singles com o nome de Blue Velvets ainda de forma bem genérica. Em 1964, após assinarem contrato com a Fantasy Records, eles mudam o nome para The Gollinwogs, mas confesso que o som não era lá essas coisas, não. Até então era um Country Rock sem muita expressão nem grande qualidade, mas já fazia um grande sucesso local (Interior da Califórnia) e lançaram alguns compactos em três anos. Porém em 1967, com um empurrão de Saul Zaentz, eles se tornam mais profissionais e decidem modificar um pouco o som e mudar o nome da banda. Creedence Clearwater Revival é o nome dessa banda. John Fogerty continua na guitarra -ótimo, por sinal-, mas vai para os vocais que antes eram do seu irmão mais velho, Tom, que também era guitarrista. Com a mudança de nome e de formação, também muda a identidade musical da banda. John trouxe um vocal muito mais influenciado pelo Soul e um som muito mais Rock ‘n’ Roll e Blues e menos Country, mas sem perder esse ar rural interiorano do Sul. Eles se distanciaram dos elementos Folk sonoros, mas se aproximaram na música em si ao regravar grandes músicas de Blues e Folk (Country Blues/Country Folk) como Leadbelly (já citado em outros textos) que retratavam a vida cotidiana do povo simples da zona rural dos estados do Sul, principalmente da população negra. Suas músicas também serviam tanto para expor essa vida cotidiana como mostrar seu orgulho regional e fazer críticas sociais como fizeram sobre a Guerra do Vietnã. Quando Creedence, a banda só existiu entre 1967 até 1972 quando se separaram. Porém o baixista Stu Cook e o baterista Doug Clifford decidiram voltar com a banda em 1995 se tornando uma banda cover deles mesmo, já que Tom havia morrido de complicações da AIDS devido uma transfusão de sangue em 1990 e John se distanciava cada vez mais do Rock e se aproximava do Country.


Creedence Clearwater Revival – Fortunate Son



Junto com toda a luta política, transformações sociais e expressões culturais que houve nos anos 1960s, vem a psicodelia. Não é toda banda de Rock Psicodélico que eu gosto, mesmo gostando de muitas. Na verdade, quando a banda se define dessa forma, ela tem que ser muito boa para que eu goste. Porém eu gosto mesmo da experimentação e incorporação de elementos variados, mas isso pode acabar ficando chato ou maluco demais para mim. Acho que bandas que acabaram se enveredando ou flertando com a psicodelia sem compromisso abstiveram resultados mais satisfatórios para mim. E não podemos negar a influência lisérgica e psicotrópica muito comum dessa época na música.


O Rock Psicodélico unia Folk, Blues, Jazz, Surf, música oriental (principalmente indiana e do Oriente Médio) e outros vários elementos de acordo com a banda. A experimentação musical e sonora não era só com elementos estéticos musicais de outros gêneros e estilos, mas também da incorporação de novas técnicas e experimentos sonoros na gravação e confecção das músicas. Um exemplo é a incorporação de elementos, na época experimentais, que seriam a base da futura música eletrônica como sintetizador e modulador. Além disso, deu uma guinada no desenvolvimento tecnológico dos instrumentos, da gravação e de pedais e amplificadores com funções cada vez mais distintas e específicas para incorporar mais e mais nas músicas. Se via muito de improviso típico das Jams de Jazz. Assim como utilização de instrumentos antigos e típicos de outras culturas. Suas músicas tem estruturas complexas com grandes mudanças no andamento e compasso com muitos solos e com letras BEM viajadas, quando tem letra, mas geralmente com certo conteúdo lírico poético ou crítico. Muitas bandas que originalmente não eram psicodélicas tiveram sua fase nos anos 1960s, principalmente no final. Vale lembrar que entre 1965 e 1969 a luta por direitos civis, protestos contra a guerra do Vietnã e a utilização maciça de psicotrópicos amplificou esse movimento. Pink Floyd, Beach Boys, Rolling Stones, The Who, The Doors, Jimi Hendrix, Beatles, Cream, Jefferson Airplane, Janis Joplin, Grateful Dead, The Byrds, The Yardbirds, Novos Baianos, Ronnie Von, Raul Seixas, Zé Ramalho, Alceu Valença, Ave Sangria e Mutantes são bons exemplos dessa primeira fase da psicodelia musical que, com o tempo, foi também se misturando em outros gêneros e estilos como Funk, Folk e Jazz.


Dando aquela valorizada no nosso produto interno, vou colocar uma banda que é referência internacional de música não só psicodélica. Em 1964, os irmãos Arnaldo Baptista e César montaram uma banda só de garotos que sabiam tocar muito bem, mas não sabiam cantar. Mas em 1965 eles convidam a filha de norte-americanos Rita Lee, que tinha uma banda só de garotas que sabiam cantar, mas não tocavam bem. Junto com Rita Lee também vem o irmão mais novo de Arnaldo e César, Sérgio Dias. Em 1966, eles gravam seu primeiro compacto. Em pouco tempo eles conseguem destaque musical que se tornam parte fixa do programa de Ronnie Von e participando do disco Ronnie Von n° 3. Em 1967 se aproximam do maestro Rogério Duprat, um dos maiores nomes do movimento Tropicália. Logo, Duprat sugere para Gilberto Gil que chamasse Os Mutantes para serem sua banda de apoio inclusive participando do III Festival da Música Popular Brasileira. Em 1968, a banda participou, ao lado de vários artistas importantes, do disco-manifesto Tropicália ou Panis et Circencis que continha a música “Panis et Circencis” feita por Gil e Caetano especialmente para Os Mutantes. E para quem não sabe, Tropicália, Tropicalismo ou movimento Tropicalista foi um movimento cultural que englobava cinema, teatro, poesia, literatura, artes visuais/plásticas e principalmente música que vinha com uma ideia de revolucionar as manifestações e expressões culturais através de um processo brasileiro de antropofagia cultural de diversos elementos culturais, mas sobretudo brasileiro. Claro que havia uma mensagem e crítica política, mas sempre de forma poética e dramatúrgica.

A banda continua seguindo o jeito psicodélico e com a mesma formação até 1972 quando Rita Lee acaba brigando com Arnaldo Baptista, que foi seu namorado, e saindo da banda para carreira solo. A banda acaba entrando numa onda mais Progressiva até 1978 quando a banda foi forçada a parar devido problemas psiquiátricos e de abuso de substâncias por parte de Arnaldo Baptista. Importante dizer que Os Mutantes misturavam música caipira/sertaneja, samba, baião, e outros ao Rock Psicodélico. Outra coisa que acho merecida ser dita é que por mais que Rita Lee tenha tido uma carreira mais conhecida e músicas comercialmente bem sucedidas, Arnaldo Baptista teve uma carreira solo musicalmente muito melhor no sentido técnico. Recomendo fortemente ouvir seu projeto A Patrulha do Espaço assim como o seu disco solo Loki.


Os Mutantes – Panis Et Circenses



Falando em Rock e música brasileira, não se pode deixar de falar na Jovem Guarda. Um movimento não só musical, mas comportamental e estético, mas completamente ligado à música. A Jovem Guarda foi para o Brasil uma junção quase que tardia entre os gêneros musicais e suas expressões culturais entre a década de 1950s e 1960s misturando Rock ‘n’ Roll, Rockabilly, Surf, Beatnik, Soul, Pop e até psicodelia. Além das notórias influências britânicas e norte-americanas, contava com forte influência do Rock ‘n’ Roll italiano. Era uma grande mistura de elementos, mas diferente do tropicalismo, eles não tinham reivindicação política, mesmo pregando certa rebeldia e liberdade principalmente na questão comportamental e na moda. Homens de cabelo grande, calça apertada e botas com salto, e mulheres com minissaia, biquini e sedutoras. Hoje pode parecer besteira, mas na época isso era o fim dos tempos para muitos. O sucesso foi tão grande que não estava só nas rádios, mas ganharam espaço na TV chegando a ter alguns programas próprios focados na música.


Pensei em colocar o clássico e clichê Roberto Carlos com seu hino “Quando”, parte do seu filme “Roberto Carlos em Ritmo de Aventura” que mostra toda a influência que musical, inclusive a influência italiana que usava muito mais solos de órgão do que solos de guitarra. Pensei em colocar Wanderleia com “Exército do Surf” para exemplificar a forma genérica das expressões culturais estrangeiras que chegavam de fora. Pensei em colocar Ronnie Von na sua fase psicodélica para lincar com a música anterior. Pensei em colocar Lafayette para mostrar a verdadeira influência do Surf ou Os Incríveis para mostrar o peso dos movimentos sociais gringos na nossa música. Mas eu vou colocar o baiano José Roberto com “Deixa Meu Cabelo Em Paz” que representa bem o que eu vivia com esse cabelo grande. Inclusive a banda Ivan Motosserra Surf&Trash tocou essa música no lançamento do livro de Zezão Castro sobre a Jovem Guarda Baiana. E se vocês repararem nessa música, tem um solinho de guitarra meio Surf com uma bateria meio samba formando o Rock danado.


José Roberto – Deixa o Meu Cabelo em Paz



Em 1967, surge The Stooges com Iggy Pop, o padrinho do Punk, no estado do Michigan nos EUA. Era uma banda de jovens rebeldes e problemáticos que só queriam tocar, mas não tinham dimensão do impacto que estavam causando no mundo. The Stooges é considerada um pilar do Protopunk levando o Garage Rock a níveis mais elevados de rebeldia, agressividade e subversão. A banda obteve destaque não só pelo seu som cru e, por assim dizer, visceral ou suas letras muitas vezes chocantes. Mas também pela performance, principalmente de Iggy Pop, nos shows tidas como escandalosas, malucas e violentas. Iggy Pop gritava, se raspava, se pintava (um dia foi tocar todo raspado, incluindo as sobrancelhas, e pintado de prata), se contorcia, se melava de comida ou sujeita, se atirava na plateia, as vezes brigava fisicamente com alguém no show (dizem que depois de desafiar um cara para brigar num show, ele pagou uma cerveja para esse cara) e se cortava com latas e cacos de vidro. Por mais que muitas pessoas se identificassem com o som e com as letras, alguns só iam para os shows para procurar confusão. Acontece que em 1968 Danny Fields da Elektra Records foi assistir o show do MC5 (banda boa e tosca que infelizmente acabou mais cedo do que deveria) e acabou vendo o show da banda de abertura que no caso era Stooges. Então fecharam contrato para três álbuns, sendo o primeiro de 1969 produzido por John Cale do Velvet Underground (o vocalista e líder do Velvet Underground era Lou Reed, um judeu problemático e desajustado que marcou a música, mesmo eu não gostando das músicas dele). Inicialmente os discos não venderam tanto e Detroit estava num estado meio apocalíptico com desemprego, pobreza e criminalidade. Os Stooges na verdade faziam sucesso em meios mais alternativos, mais underground. Poderia ficar um bom tempo relatando diversas façanhas e aventuras que eles, principalmente Iggy Pop, fizeram entre 1960s e 1970s como a casa velha que eles alugaram para morar e ficou cheia de músicos, vagabundos e tietes. Ao invés disso eu vou recomendar um ótimo livro feito à base de entrevistas sobre esse cenário do Protopunk do fim de 1960s e começo 1970s que é “Mate-me, Por Favor”. Ganhei esse livro há alguns anos de um amigo e achei muito mais divertido do que informativo, mas recomendo a leitura, pois é dinâmica e envolvente. Na verdade, esse livro parece que você fez amizade com um amigo de seus amigos que você não tem muita amizade e ele começa a contar histórias sobre esses seus amigos que você gosta muito, mas não tem tanto contato quanto gostaria.


The Stooges – I Wanna Be Your Dog



No próximo texto pretendo continuar essa saga adentrando os anos 1970s e 1980s.


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