Leonard Cohen – The Partisan – Reprodução
O dia 28/04/2022, dia da publicação desse artigo, corresponde ao dia 27 do mês de Nissan do ano 5782, o Yom HaShoá. O dia (em memória) do Holocausto é, sem dúvidas, uma data extremamente marcante não só para o povo judeu, mas para toda humanidade. Cerca de seis milhões de judeus, mais ou menos dois terços da população judaica da Europa, foram brutalmente explorados, humilhados e assassinados pelo regime nazista. Além dos judeus, principal alvo do extermínio, ciganos, poloneses, comunistas, anarquistas, homossexuais, prisioneiros soviéticos e negros de colônias francesas, testemunhas de Jeová e deficientes físicos e mentais eram o foco da “limpeza” étnica e ideológica dos algozes nazifascistas. O Holocausto foi o maior genocídio do século XX, o que historicamente é muito próximo dos dias atuais, totalizando aproximadamente onze milhões de pessoas. Uma data para nunca esquecer e lembrar de sempre combater a intolerância.
Infelizmente, por mais que se tenha passado setenta e sete anos do fim da Segunda Guerra Mundial, a intolerância e os movimentos baseados na ideologia nazifascista ainda são presentes na sociedade. Características como intolerância, conservadorismo radical, racismo, homofobia, antissemitismo e ação direta violenta são elementos que moldaram o nazifascismo que ainda está presente em grupos, movimentos e partidos políticos, principalmente na Europa. O fascismo é um movimento de extrema-direita que surge na Europa no pós-Primeira Guerra Mundial nascendo na Itália, mas se espalhando rapidamente por toda Europa. Combinava ultranacionalismo, corporativismo, anticapitalismo, anticomunismo, antiliberalismo, totalitarismo, militarismo, conservadorismo moral radical e elementos positivistas. Não demorou muito para que uma versão ainda mais perversa e maligna surgisse como foi o caso do nazismo. O nazismo é um movimento fascista que incorporou elementos racistas, racialistas e antissemitas de forma muito mais aprofundada, dando uma conotação muito mais étnica e cultural ao ultranacionalismo. Assim como o nazismo “superou” a ideologia fascista com ideias eugênicas como a Solução Final. Esses movimentos surgiram como oposição ao regime democrático, ao sistema parlamentar e aos pensamentos liberais, marxistas e anarquistas, defendendo um Estado totalitário ufanista e militarista com economia mista (estatal e privada nacional), moralmente enviesado e conciliador de classes (defendendo algumas questões trabalhistas assim como favorecendo a elite industrial e rural nacional). Importante estar alerta (e combatente) para esses elementos ainda presente na vida social e política.
Em homenagem à essa data, preparei uma lista focada em artistas judeus, principalmente aqueles que sobreviveram ou tem uma história próxima ao Holocausto ou à intolerância.
Billy Joel, como eu já disse e direi muitas vezes sobre vários artistas, é um dos meus cantores favoritos. Judeu novaiorquino nascido no Bronx de um pai judeu alemão Karl Amsom Joel e da judia inglesa Rosalind Nyman. O pai de Joel fugiu da Alemanha para Suécia e depois para o EUA devido à perseguição nazista na época. Interessante que o pai de Joel, que era pianista e comerciante, se muda para Viena após o divórcio em 1960, onde tem um filho chamado Alexander que é um aclamado regente de música erudita da Europa e diretor-chefe da orquestra Staatstheater Braunschweig. Joel, que para mim parece a versão de um universo alternativo de um Elton John judeu, aprendeu a tocar piano desde criança e logo na adolescência aprendeu boxe para se defender dos colegas que o importunavam por preferir música aos esportes. Foi um boxeador amador de relativo curto sucesso até quebrar drasticamente o nariz. Essa música foi gravada em 1977 após uma visita que fez ao seu pai e que seria uma metáfora não proposital sobre o envelhecimento/amadurecimento o sobre seu pai.
Billy Joel – Vienna
Bob Dylan, já citado outras vezes nessa coluna, acho que destacou mais por seu ar revolucionário na música e ativista da política (numa união de ambos) do que por seu jeito de cantar (um pouco “estranho”). Entre suas várias músicas de protesto, uma das mais famosas e clássicas é “Blowin’ In The Wind” ele nos enche de perguntas e questionamentos sobre paz, liberdade, intolerância e nos responde que a resposta está soprando no vento. Acredito que a resposta seja no respeito, coexistência, solidariedade e justiças, o que interpreto como elementos essenciais para Tikun Olam.
Bob Dylan – Blowin’ In The Wind
Leonard Cohen é um icônico músico judeu. Famoso por sucessos como “Hallelujah”, esse judeu canadense passou anos num mosteiro budista, mas nunca deixou de lado sua origem e herança cultural judaica. É importante ressaltar que os judeus não são só um grupo religioso como muitos pensam, mas também são um povo (grupo étnico) e uma cultura, claro que tendo suas subdivisões e ramificações. A pessoa não precisa ter um para ter os outros, ou seja, a pessoa não precisa ter todos os requisitos para ser um judeu e até os nazistas entendiam isso. Mas já essa música é uma homenagem aos Partisan, grupos paramilitares (tropas não regulares) de resistências locais contra o avanço no nazifascismo na Segunda Guerra Mundial. Esses grupos eram formados por civis e militares dos países nazifascistas ou ocupados por eles. Muitos membros desses grupos eram formados por judeus, comunistas e anarquistas.
Leonard Cohen – The Partisan
Chava Alberstein é uma cantora israelense nascida na Polônia em 1946, um ano após o fim da Segunda Guerra Mundial. Importante ressaltar que a Polônia tem um histórico de antissemitismo que vai de muito antes do nazismo e mesmo após a guerra, mais de vinte mil judeus libertos de campos de concentração foram mortos por antissemitismo entre 1945 e 1946. “Zog Nit Kayn’Mol” é uma música em iídiche escrita em 1943 pelo jovem judeu e militante socialista Hirsh Glick no Gueto de Vilna. Glick fazia parte da organização de Partisan de Vilna e fez sua música inspirado em uma música soviética pré-guerra. Muitos atribuem essa música ao Levante do Gueto de Varsóvia em que militantes judeus, com apoio de Partisans poloneses, conseguiram promover uma revolta entre 19 de abril até 16 de maio de 1943. Mas a verdade é que se tornou um hino Partisan, o hino judeu Partisan.
Chava Alberstein – Zog Nit Kayn’Mol
Esther Béjarano Löwy nasceu na Alemanha em 1924 filha de um cantor judeu que sempre encorajou a se dedicar à música. Quando aumentou a perseguição nazista, ela tenta emigrar à Palestina Britânica, mas não conseguiu. Em 1943 foi deportada para o campo de Auschwitz para trabalhar carregando pedras até se juntar à Orquestra Feminina de Auschwitz onde tocava acordeom. Emigra para Palestina Britânica em 1945 e volta de Israel à Alemanha em 1960 junto ao seu marido e seus dois filhos. Sempre foi engajada na causa daqueles que sobreviveram aos horrores do nazismo e honrando sua cultura judaica através da música, Béjarano morreu em 2021 aos noventa e seis anos.
Esther e Edna Béjarano & Coincidence – Mir Lebn Ejbig
Se você é judeu e não assistiu ao filme do controverso diretor judeu Roman Polanski, “O Pianista”, recomendo que pare de fazer o que estiver fazendo e assista essa logo. O filme narra a história do famoso pianista judeu polonês Władysław Szpilman, representado pelo ator judeu Adrien Brody. Szpilman era um brilhante músico que trabalhava na rádio de Varsóvia e viviam bem com sua família até a ocupação nazista da Polônia. Aos poucos vai vendo seus direitos civis sendo retirados até que não fosse mais um cidadão para o Estado e nem mais humano para sociedade. Vai para o Gueto e consegue fugir com ajuda antes de ser enviado para os campos de concentração como sua família foi. Inclusive Szpilman assiste ao Levante do Gueto de Varsóvia pela janela do apartamento que se escondia.
Władysław Szpilman – Mazurka
Alice Herz-Sommer nasceu em 1903 em Praga no Reino da Boêmia quando esse fazia parte do Império Austro-húngaro. Alice, cujos pais sempre trabalharam com cultura e intelectuais, começou a tocar piano ainda jovem e fazia apresentações por toda Europa até que os nazistas invadiram Praga e não permitiram mais que os judeus participassem de concursos de música ou ensinassem alunos não judeus. Boa parte de sua família e amigos emigraram para a Palestina Britânica e Romênia, mas Alice não pode ir para cuidar de sua mãe já idosa. Mas em 1943 ela foi enviada para o campo de Theresienstadt e sua mãe foi assassinada. Seu marido morre de tifo no campo de concentração de Dachau. Após a libertação soviética de Theresienstadt, ela e seu filho Raphael voltam para Praga até emigrarem para Israel em 1949. Se manteve lá até 1986, quando se muda com seu filho para Londres, onde seu filho se torna um importante violoncelista e maestro. Alice morreu em 2014 aos cento e dez anos.
Alice Sommer - Herz
Heinz Jakob “Coco” Schumann nasceu em Berlim em 1924 e fez parte do grupo de cantores do campo de Theresienstadt. Foi um notável guitarrista de Jazz alemão que sobreviveu ao Holocausto. Nasceu numa típica família cristã alemã, mas se converteu ao judaísmo ao casar-se com uma esposa judia, porém adotou a vida judaica e isso foi o suficiente para também ser perseguido pelo nazismo. Chegou a gravar com grandes nomes como Ella Fitzgerald.
Coco Schumann – Shishkebab
Bella Ciao é uma música popular que tem sua origem em uma canção dos trabalhadores camponeses italianos do final do século XIX. Posteriormente a música foi adaptada como protesto contra a Primeira Guerra Mundial. E finalmente foi adaptada como símbolo da Resistência Italiana contra o fascismo. A música ficou muito famosa por sua aparição na famosa série da Netflix “La Casa de Papel”. Chegou a ganhar versão remix e até versão Funk e muita gente ouviu sem saber sua origem ou o que ela significa. Mas se trata do hino Partisan italiano e simboliza a luta contra o fascismo.
Bella Ciao
Kiss é uma das mais famosas bandas de Hard Rock e Glam Rock que existem. Acho difícil alguém nunca ter ouvido alguma famosa canção como “Rock And Roll All Nite” e acho mais difícil ainda alguém não reconhecer esses rostinhos pintados. Nem todos sambem, mas os fundadores do Kiss são judeus. Paul (Eisen) Stanley nasceu em Nova Iorque de uma mãe judia holandesa que fugiu da perseguição nazista e Gene Simmons (Chaim Witz), um israelense filho único de uma mãe solteira sobrevivente do Holocausto de origem húngara.
Kiss – I Was Made For Lovin’ You
Di Nigunim é uma, como eles mesmos se definem, de Klezmer Anarco-Punk com uma agenda política. Não sei se a banda inteira é de judeus, mas pelo menos parte dela é. Eles formaram a banda depois dos anos 2000 em San Diego na Califórnia unindo elementos da musicalidade judaica, sobretudo do Klezmer, com a base no Punk e Hardcore, não só na música, mas nos posicionamentos políticos. Já existe um termo para subgêneros do Punk com elementos do Leste Europeu e de grupos étnicos de lá, Gypsy Punk. Existe similaridade entre esses “Folks” mesmo sendo de grupos diferentes, porém cada um tem sua particularidade. Acho que seria genérico e até um pouco preconceituoso chamar uma música com elementos de origem judaica de “Punk Cigano”. E essa música fala justamente do problema do fascismo que vai aos poucos roubando suas liberdades, agredindo e silenciando, a verdadeira degradação fascista que toda sociedade pode estar sujeita a passar. Inclusive lembro de colocar sempre essa música quando trabalhava num bar no Rio Vermelho, principalmente quando um policial civil que orgulhosamente se dizia nazista aparecia por lá.
Di Nigunim - Fascist Degradation
OBS: Queria fazer uma festa assim.
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