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Foto do escritorIvan Motosserra Pamponet

Rock: Parte 2


Imagem de Amir Boucenna por Pixabay



Dando continuidade à homenagem ao Rock e seus variados subgêneros, darei seguimento ao analisar os principais estilos surgidos ou desenvolvidos entre as décadas de 1970 e 1980. Iniciarei falando sobre o irmão menos doido e mais estudioso do Rock Psicodélico, o Progressivo. O surgimento de um está ligado ao outro e muitas das principais bandas psicodélicas foram importantes para o desenvolvimento do Progressivo, como no caso de Pink Floyd. Importante frisar que essa ideia de sempre ter que categorizar e determinar características e padrões para as coisas é típica da forma como trabalhamos a ciência ocidental. Muitas vezes a pessoa que criou algo -como exemplo uma música progressiva- nem sempre tinha um objetivo específico de se criar exatamente aquilo seguindo todas as normas e padrões protocolados de forma científica. Muitas vezes o objetivo era simplesmente fazer uma música muito boa e a junção de técnicas musicais e referências culturais acabam levando a pertencer a certos grupos. Mas é muito comum que uma banda, álbum ou música não fique preso somente a um estilo ou subgênero, mas podendo trafegar entra alguns e podendo pertencer a mais de um.


Interessante saber que o Rock Progressivo não surge de forma planeja ainda no fim dos anos 1960 quando o Psicodélico estava em alta. Ele faz o caminho reverso do Psicodélico que vai dos EUA para Europa e mundo, indo da Europa -sobretudo Inglaterra e Alemanha- para os EUA e mundo. Seus músicos, assim como os Psicodélicos, estavam focados na experimentação musical e rejeitavam rótulos e padrões, mas muitos tenham uma formação erudita. Enquanto nos EUA havia uma distinção social mais clara em quem produzia e reproduzia música erudita e música popular, na Europa, os filhos da aristocracia crescidos no erudito se influenciavam por todos um vasto repertório popular e fundiam os dois mundos em algo novo. A cena inglesa poderia ser resumida como um garoto classe-média/rico que cresceu com aulas de piano clássica, ouvindo óperas e lendo grandes nomes da literatura, se apaixonando por Blues e Jazz dos EUA. Isso traduz mais da metade das bandas de Progressivo da época.


Jethro Tull (seria uma referência a Jetro, pai de Tzipora e sogro de Moisés?), é uma banda inglesa formada em 1967 que unia elementos de música erudita, vários tipos de Folks, Jazz, Blues e Rock em álbuns temáticos com letras poéticas que muitas vezes se completavam em histórias densas. Seu vocalista, principal compositor e líder, o escocês Ian Anderson, sempre foi uma figura muito excêntrica tanto em suas composições complexas e de ar dramatúrgico, quanto em suas performances ao cantar e tocar flauta. Muitas vezes se equilibrava numa perna só com a outra perna apoiada sobre outro joelho levemente flexionado com movimentos quase que dançantes similares a encantadores de serpentes. “Aqualung” título tanto da canção quanto do álbum, teria sido feito baseado nas experiências de Ian Anderson numa viagem para ver seu pai doente. Fala sobre pessoas sombrias e de tendencias malignas com um ar mórbido, e até mesmo mensagens religiosas numa visão mais libertária. Tudo isso de forma muito poética e com estruturas musicais bem construídas que vão da simplicidade ao complexo de forma bem encaixada.


Jethro Tull – Aqualung



Escolhi essa música pois se meu gato estivesse vivo, faria 10 anos essa semana e esse disco foi a trilha sonora do seu parto. Mas é difícil escolher uma banda para representar esse gênero entre Pink Floyd, Rush, Genesis, Triumvirat, Yes, The Moodu Blues, Emerson, Lake & Palmer, Focus, Camel, King Crimson e até bandas como Beatles e The Who também andaram brincando por essa área. Vou confessar, mas a verdade é que no geral, é acho um gênero muito chato. Reconheço que todos os músicos são exatamente talentosos, virtuosos, técnicos, habilidosos e criativos, mas muitas vezes aquela viagem toda se torna algo não atraente e que acaba me fazendo viajar pensando em outras coisas e não na música em si. Acho que as vezes a banda ou o músico se empolgam num solo ou em um determinado momento da música e acabam ultrapassando o pouco os “limites”. Ou talvez seja só uma questão de ego de alguns músicos em querer mostra quão bons eles são. Me lembro como meus amigos tentavam me fazer gostar de metal progressivo e simplesmente nunca gostei de nenhuma banda do estilo pois acho dois propostas bem distintas e que não dialogam tão bem para mim, mas não que eu esteja ditando regras. Ou então quando meus amigos tentavam me convencer a gostar de Rush e isso me fez ouvir toda discografia da banda e acho que gostei de 5 ou 7 músicas.


Músicas longas com harmonias e melodias complexas; Álbuns conceituais com temas e histórias desenvolvidas e exploradas em todo o álbum, muitas vezes em estruturas similares a Óperas (o que deu origem a Ópera Rock); Letras, quando tem, que abordam temas como ficção científica, fantasia, mitologia, religião, filosofia, guerra, amor, loucura, história e folclore, ou até mesmo peças e obras antigas; Uso de instrumentos eletrônicos como teclados, órgãos, moduladores e sintetizadores (inclusive deu origem ao Krautrock alemão que deu origem influenciou diretamente a música eletrônica); Uso de instrumentos atípicos ao Rock como flautas, violino, bandolim e outros; Solos enormes (muitas vezes chatos); Músicas e álbuns estruturados semelhantes a peças de música eruditas ou Óperas com variações grandes como em movimentos diferentes na mesma peça que é subdividida em várias partes. Creio que essas podem ser ditas como as principais características estéticas do Progressivo.


Formada em 1969 em Recife, Ave Sangria é um dos maiores marcos do gênero aqui no Brasil e é uma das minhas bandas favoritas. Unindo Psicodélico com Progressivo e Folk (nesse caso específico, os elementos culturais regionais incorporados foram baião, forró e samba) se tornaram um dos principais expoentes musicais da década de 1970. A banda, como Ave Sangria, não durou muito e encerrou suas atividades em 1974 logo após o lançamento do seu -por muito tempo único disco- álbum Ave Sangria que sofreu censura pelo regime militar em relação a canção “Seu Waldir” que foi vista como moralmente transgressora por um suposto conteúdo homossexual. Sendo que em entrevista décadas depois, o vocalista Marco Polo diz que Seu Waldir nunca existiu e era só uma música boba de amor. A música não tem nada demais, mas a Ditadura retirou o álbum depois pouco mais de um mês nas lojas. Antes de seu relançamento recente era um disco muito raro de se encontrar e ainda tinha o risco de ser um disco censurado com a faixa arranhada à prego. Posteriormente a banda se reorganizou e acompanhou Alceu Valença, Zé Ramalho, Lula Côrtes e outros grandes nomes.


Ave Sangria – O Pirata



Também bebendo das duas fontes tão próximas, Psicodélico e Progressivo, surge o Space Rock. Para tentar resumir: Space Rock é menos trabalhado -no sentido técnico musical- que o Progressivo, menos viajado -no sentido lisérgico- que o Psicodélico e com uma temática muito mais ligada a ficção científica e ficção de horror. As músicas também tem vários - e as vezes longos- solos instrumentais cheios de guitarras e sintetizadores experimentais. Voltando a comparação em que o Psicodélico é o irmão mais doido e o Progressivo é o mais estudioso, Space Rock é menos famoso, mas conseguiu achar um equilíbrio entre os dois. Inclusive alguns álbuns e músicas de bandas como Pink Floyd, Rush, Black Sabbath, The Byrds, Moody Blues e Blue Öyster Cult -bandas que não são consideradas como integrantes de fato do gênero- são vistos como grandes exemplos desse gênero. Como já disse antes, tentar definir bandas em um gênero ou estabelecer padrões pode ser perigoso e falho, pois muitas trafegam entre vários estilos sem nem perceber.


Hawkwind, um dos maiores expoentes do gênero, é uma banda muito pouco conhecida pelo grande público em geral. Até hoje eu conheci poucas pessoas que conheciam a banda e metade das que conheciam só ouviram falar ou ouviram poucas músicas. Eu conheci ao ver um documentário sobre o grande Lemmy do Motörhead que foi baixista e dividiu vocais entre 1971 e 1975 até ser demitido da banda após ser preso no Canadá antes do show. Lemmy que tinha acabado de ser roadie de Jimi Hendrix, já tinha alguns pequenos atritos com a banda por ter uma personalidade -digamos assim- mais ATIVA enquanto o restante da banda era mais tranquilo (headbangers podem até tentar amizade com hippies, mas a convivência prolongada pode ser prejudicial para a amizade). A banda pode são ser a mais lembrada, mas foi fundamental para o Rock como um todo e está até hoje na ativa. Então escolhi uma música que tanto mostra bem a estética sonora do Space Rock, quanto Lemmy jovem e por ser uma banda de Rock com uma integrante responsável por fazer performances não necessariamente musicais.


Hawkwind – Silver Machine


No final da década de 1960 surge o que é chamado de Soft Rock, que seria um Pop Rock bem palatável ao grande público e comercialmente vendável. Muitas vezes com um ar mais romântico ou aquela dor de cotovelo (Brega internacional). Geralmente eram músicas simples e melódicas, mas com grande produção. Era o gênero que mais se destacava nos programas de rádio e TV, assim como permitiram o desenvolvimento a lógica dos Singles em Compactos em que, muitas vezes, o artista não focava em álbuns, mas sim em músicas. Quem aqui não consegue fazer uma listinha mental de artistas e bandas que só fizeram sucesso por uma única música? Quem tem ou teve alguma edição daquelas coletâneas Flashback tira de letra.


Talvez minha descrição tenha passado a ideia de que eu não gosto desse gênero. A verdade é que eu gosto, porém, a maioria das músicas é mais por um valor nostálgico. Então poderia dizer que gosto, mas não dou muito valor. E para representar nossa comunidade judaica irei escolher o Elvis Judeu, Neil Diamond. E essa fofa música “Sweet Caroline” foi inspirada na filha de JFK em 1969. Não sei se eles tiveram algum envolvimento, mas a música é um sucesso até hoje.


Neil Diamond – Sweet Caroline


Os termos Soft Rock e Hard Rock surgiram nas rádios no fim da década de 1960 para diferenciar as músicas mais agitadas e agressivas das leves e calmas. Inicialmente o Hard Rock se referia a bandas de Garage Rock e Blues Rock que seriam tidas como pesadas demais para o grande público, mas que ainda sim tinha seu nicho mercadológico.


Basicamente o Hard Rock é um Rock cru e agressivo como o Garage Rock só que muito mais focado no Blues na sua estrutura musical. Tanto é que muitas bandas regravaram grandes clássicos de Blues e se definem como Rock ‘n’ Roll. Voltando para aquela outra questão já levantada que muitas dessas cenas músicas não eram planejadas, mas sim resultado em comum da interpretação das mesmas influências.


Uma banda que representa muito bem tudo isso que acabei de dizer é o AC/DC que trafega com maestria entre o Rock ‘n’ Roll, Blues Rock, Hard Rock, Garage Rock e Heavy Metal (o Hard Rock foi crucial para o Heavy Metal), mas definia sua música simplesmente como o bom e velho Rock ‘n’ Roll. E existe um fato curioso sobre a banda que me lembra Bee Gees: a banda é australiana, pois foi formada na Austrália, mas os irmãos guitarristas Angus e Malcolm Young são escoceses, o primeiro vocalista, Dave Evans, era de Gales e o segundo e principal vocalista, Bon Scott, era escocês. Deixando só Mark Evans, baixista, e Phil Rudd, bateristas, como membros originais australianos. E seu terceiro e atual vocalista, o mais conhecido por muitos, Brian Johnson, é inglês.


AC/DC é uma das bandas mais influentes tanto no Rock quanto no Metal e até menos, em menor escala, no Punk. E se um dia conhecer alguém que não goste de AC/DC, desconfie fortemente que ele não gosta de Rock. E para exemplificar muito bem o que é Rock ‘n’ Roll e Hard Rock, escolhi esse hino do seu segundo disco T.N.T. de 1975 e que também está presente na reedição do primeiro disco “High Voltage” de 1976. Além de ser uma música fantástica e empolgante que representa tudo isso que eu disse, o clipe é simples e tudo que uma banda sempre quis fazer pelas ruas da cidade e ainda conseguem misturar solo de gaita de fole escocesa com solo de “Blues pesado”.


AC/DC – It’s A Long Way To The Top (If You Wanna Rock ‘n’ Roll)



Pode até ter nascido no finalzinho de 1960, mas só venho ser relevante no começo de 1970. O Glamour Rock ou simplesmente Glam Rock seria um tipo de irmão do Hard Rock que decidiu seguir uma linha mais artística e irreverente com influências meio Drag Queen no visual. Na verdade, se misturavam vários estilos musicais como Rock ‘n’ Roll, Hard Rock, Pop, Psicodélico, Garage, Space e elementos estéticos teatrais e de Cabaret em sua formação. Com um ar artístico e viajado, roupas e penteados extravagantes, maquiagem forte, pinturas, fantasias, saltos plataforma, glitter, androgenia e muita teatralidade eram as bases estéticas para além da música. Mais tarde iria se fundir com o Metal e Punk produzindo ainda mais subversões artísticas.


Um grande marco desse estilo foi o homérico álbum de David Bowie de 1972 “The Rise And Fall Of Ziggy Stardust And The Spiders From Mars” que conta a história de Ziggy Stardust, um Rock Star alienígena bissexual andrógeno que atua como um mensageiro de um extraterrestre que tenta conscientizar e trazer esperança a humanidade nos últimos anos de vida. Ziggy é “roqueiro” selvagem e promiscuo (e usuário de certas substâncias) que tenta passar uma mensagem sobre paz, amor e união, mas é morto pelo consumismo e pelos seus próprios fãs. Bowie, grande camaleão da música, criou Ziggy durante uma turnê em Nova Iorque e o começou a interpretar em shows antes mesmo do lançamento do álbum. Ziggy marcou para sempre a música sendo um álbum maravilho (e podendo ser considerado uma Ópera Rock Progressiva ao mesmo tempo que flerta com o Protopunk). Ziggy nasceu e morreu nos palcos, mas, assim como seu criador, continuará eterno.


Eu escolhi essa música mesmo não sendo o melhor exemplo em sonoridade, mas é a mais bonita e que mais me tocou em todo o álbum. Para deixar bem claro a descrição que fiz, colocarei uma versão ao vivo que não é tão boa quanto a de estúdio, mas ajuda a ilustrar os elementos visuais.


David Bowie – Rock ‘n’ Roll Suicide


O que irei dizer agora carrega consigo certa verdade e muita polêmica, mas tentarei desenvolver bem meu argumento para que não seja mal-entendido. A grande maioria das pessoas dizem que Black Sabbath foi a primeira banda de Metal, e eu concordo plenamente, mas não concordo com Black Sabbath ser uma banda definida como Heavy Metal. Inicialmente eles queriam, assim como Ramones, ser simplesmente uma banda de Rock e uma de suas maiores influências eram os Beatles. Mas aqueles quatro jovens ingleses desajustados com as mentes levemente perturbadas acabaram revolucionando da música de uma maneira bem mais autêntica. Principalmente em seus primeiros álbuns, se pode ver que, por mais que não tenha surgido nada mais pesado antes (até então o mais pesado que se tinha era Blue Cheer ou Led Zeppelin), Black Sabbath bebeu de várias fontes como Blues e Psicodélico junto a um ar mais obscuro e soturno típico de filmes de terror (incluindo o nome da banda que é por causa de um filme homônimo de 1963 com Boris Karloff). E se analisarmos bem, Black Sabbath com Ozzy é bem diferente, por mais que tenha muita coisa em comum, com as demais bandas de Heavy Metal que surgiram depois como Judas Priest ou Iron Maiden. Eu diria que Black Sabbath só se tornaria de fato Heavy Metal em 1980 com o álbum “Heaven and Hell” já com Dio nos vocais, pois, até então, eu defino Black Sabbath como Black Sabbath, um som único que não deixa de ser Metal.


Black Sabbath – Black Sabbath


Iniciei ao falar de Black Sabbath colocando a música “Black Sabbath” do álbum “Black Sabbath” de 1970 que julgo representar muito bem essa primeira fase da banda. Mas agora me dedicarei ao gênero como um todo.


Inicialmente não havia muita distinção entre Hard Rock e as primeiras músicas de Heavy Metal. Muitas bandas de Heavy Metal começaram como Hard Rock como Judas Priest, Scorpions, Deep Purple e Alice Cooper. Ou bandas que trafegavam entre esses gêneros e outros como Led Zeppelin, Kiss, Queen, AC/DC, Blue Cheer e até mesmo Rush. Essas bandas foram forjando os elementos principais para consolidação do Metal como um gênero importante que posteriormente teria tantas subdivisões quando o Rock. Unia elementos de Hard Rock, Blues Rock, Garage, Psicodélico e até progressivo numa roupagem cada vez mais pesada e distorcida com uma certa saturação que “sujava” o som junto com um ar mais sombrio da música e nas letras. E não era extremo somente no som e nas músicas, mas em sua teatralidade também. Certa vez Bruce Dickinson afirmou que o Heavy Metal seria a Ópera do proletariado. Inicialmente, a primeira leva desse gênero tinha certo desdém na forma como os críticos viam a cena, mas se firmaram por cultivar um enorme público fiel que mais tarde se tornariam uma subcultura espalhada no mundo todo, os headbangers. Como toda expressão cultural, com o tempo foram surgindo subdivisões musicais cada vez mais “especializadas” em determinados ramos ou que incorporavam outros elementos de fora. Durante o fim da década de 1970 e o começo de 1980 se teve a primeira cisão no gênero que se dividiu em um gradativo e mais agressivo Metal que através do Motörhead incorporou velocidade, agressividade e crítica do Punk; e um Metal cada vez mais melódico e folclórico como o “New Wave of British Heavy Metal”. Eu sou um headbanger (“metaleiro”), mas praticamente não gosto dessas variações mais melódicas, dando preferência a variações mais agressivas (extremo).


Essa segunda fase do Black Sabbath não chega a ser “New Wave of British Heavy Metal”, mas seria um típico exemplo de Heavy Metal Clássico mais melódico e menos sombrio que pavimentou a estrada para essa fase do Metal, assim como Black Sabbath em sua primeira fase pavimentou a estrada para o surgimento do gênero. Existe uma discussão imbecil, assim como a de Beatles e Stones, sobre quem seria melhor, Ozzy ou Dio. A verdade é que os dois são excelentes para o que se predispões a fazer e as duas fases do Black Sabbath são boas, porém BEM diferentes. Tecnicamente falando, Dio é um vocalista melhor que Ozzy, mas ele não conseguiria nunca fazer do Black Sabbath o que Ozzy fez. É como comparar duas bandas diferentes, mas com o mesmo nome. Mesmo sendo um grande fã de Dio, Black Sabbath de verdade é com Ozzy (Essa é uma discussão antiga e polêmica que já tive milhares de vezes, principalmente com meu amigo Tiago).


Ninguém do Black Sabbath é judeu, mas duas coisas relacionadas que seria interessante de mencionar. A primeira é que Ozzy renovou votos com sua segunda esposa Sharon em diversas religiões incluindo o judaísmo. E Geezer Butler, baixista e principal letrista, é casado com uma judia e certa vez socou um fã bêbado que o parou num bar para um autografo e, sem saber esse pequeno detalhe, aproveitou para fazer um discurso antissemita.


Black Sabbath (com Dio) – Heaven And Hell



O Punk Rock, de todas as manifestações artísticas já citadas aqui, é a vai mais além da música se tornando um movimento cultural que abrange diversas áreas. Assim como seria o movimento cultural, entre os citados, mais ligado a questões políticas e sociais. Surge tanto nos EUA quanto no Reino Unido de forma independente em cenas locais. Muitas bandas underground, principalmente de Garage, já carregavam consigo o embrião do Punk em sua estética física e sonora, assim como em suas crenças ideológicas. Quando finalmente o Punk se estabeleceu em meados da década de 1970, percebeu-se que várias bandas já faziam um som similar, como no caso dos Stooges e New York Dolls, mais ainda não eram Punks de fato. Inclusive reza a lenda que o primeiro artista a ser chamado de Punk (que pode ser traduzido como “vagabundo”, “sujo” e “delinquente”) foi Iggy Pop. Se analisarmos bem tanto as primeiras bandas de Punk quanto de Protopunk, suas inspirações são versões distorcidas de Garage, Rock ‘n’ Roll, Surf, Rockabilly, Hard e Glam Rock. Outra característica importante que a ruptura com padrões estéticos e morais vigentes e a crítica as bandas e músicas comerciais ou com características rebuscadas típicas dos músicos eruditos muito presente no Psicodélico e Progressivo. De certa forma, é um resgate a simplicidade estética junto com uma agressividade revolucionária que vai da música à política.


Há alguns anos, estava tendo mais uma das milhares de discussões musicais que já participei, mas dessa vez com um antropólogo hippie fã de Progressivo e Psicodélico. Ele, ao contrário do que aprendeu na faculdade de Ciências Sociais, analisou a música -uma manifestação cultural- como uma linha evolutiva em que basicamente o Rock ‘n’ Roll seria o começo e que estaria em constante evolução e, partindo desse ponto, o Psicodélico e Progressivo seriam suas formais mais evoluídas como num processo de evolução natural. Porém consegui quebrar essa ideia sem que ele precisasse gostar de Punk para isso. Consegui evidenciar que existia juízo de valor que que ele estava cometendo o mesmo erro que os evolucionistas culturais que tanto condenamos faziam no começo da Antropologia. Que na verdade não se trata de evoluir ou não, mas de modificar e desenvolver em diversas formas o que já existia. Nenhum gênero musical nasce com o objetivo de ser superior aos demais, mas sim como uma livre expressão artística que compila diversas influências. Do mesmo jeito que um fã de Progressivo analisa o Punk como simplório e pobre musicalmente, um Punk pode analisar -e isso ocorre muito dos dois lados- o Progressivo como chato e elitista. De certa forma, os dois tem certa razão, mas essa não é a questão. Um músico de Progressivo pode achar que sua música é a verdadeira evolução do Rock por questões técnicas, como um músico Punk pode achar que sua música é a verdadeira evolução do Rock por uma maior proximidade com o som original. Mas e daí? Daí que os dois são derivações da mesma coisa, mas de formas completamente diferentes e em nenhum momento algum dos pioneiros do Rock ‘n’ Roll dos anos 1950 disse que existiria uma evolução dessa forma. Inclusive, falando em tecnicalidades, por mais que o Punk seja mais “simples” com poucos acordes e notas, não é qualquer pessoa que toca daquele jeito. Ter uma banda de Punk ruim é fácil, mas ter uma banda que faz a diferença são outros quinhentos.


Assim como o Metal e o próprio Rock, o Punk acabou desenvolvendo diversos subgêneros variados e até antagônicos entre eles. Se misturando com elementos estéticos de outros gêneros ou se subdividindo por questões políticas. Pode falar de amor ou de política, pode ser anarquista ou até nazista, pode ser underground ou Pop e por aí vai. Algumas bandas fazem ótimas músicas falando besteira, outras fazem péssimas músicas com letras com boa carga política, mas nem todas conseguem unir as duas coisas.


Eu falei de Punk no texto de apresentação ao falar de minhas influências. Falei de Ramones, pois, querendo ou não, foi a maior banda do gênero e influenciou diversas bandas dos mais variados estilos e gêneros. Ramones foi um marco musical e, não sei dizer se foi exatamente a primeira como muitos dizem, mas foi uma das primeiras e para mim será sempre a primeira de fato (outra discussão polêmica). Não escolhi Ramones unicamente por isso, mas também por ser uma banda de quatro integrantes sendo o vocalista Joey e o baterista Tommy judeus. A música que eu escolhi foi “I Wanna Be Your Boyfriend” escrita por Tommy e que mostra uma doçura quase ingênua e um pouco melancólica que permeava a banda que tinha como uma de suas maiores inspirações Beatles e The Who. Mas hoje eu falarei de outra que foi uma das maiores bandas Punk de todos os tempos.


Dead Kennedys surgiu em São Francisco em 1978. Eles eram rápidos, agressivos, loucos e politizados, assim como tocavam bem melhor que a maioria das bandas do gênero. Suas letras eram geralmente políticas e cheias de críticas e sátiras à política, autoridades, guerras, a cultura e até ao próprio movimento Punk. Em 1979 eles lançam seu primeiro sucesso “California Über Alles”, uma crítica ao governador da California da época, Jerry Brown, fazendo alusão ao hino da Alemanha nazista que significa “California acima de tudo” assim como comparações do governador como Grande Irmão do livro distópico 1984. Logo depois lançam “Police Truck”, uma crítica a violência policial com fortes influências de Surf e “Holiday In Cambodia”, uma crítica a guerra. Interessante que a banda obtém sucesso tanto pelas músicas em si quanto por seu ativismo político o que fez com que Jello Biafra, o vocalista, se candidata-se ao cargo de Prefeito de São Francisco (numa campanha muito engraçada e irônica) e entre suas propostas estavam a de políticos serem obrigados a andar com nariz de palhaço e policiais fossem escolhidos por votação popular. Com um Slogan de “Apocalipse Agora! Jello para prefeito!” (seria uma referência ao filme “Apocalypse Now”?). Ao longa da história da banda, ela se meteu em diversas polêmicas que acarretaram em grandes debates sobre censura. Suas capas e letras chocavam os setores mais conservadores e, além da perseguição de alguns políticos e parte da mídia, havia donos de lojas que se negavam a vender seus discos. Pode se dizer que a banda ajudou a forjar o que se tornou o Hardcore Punk junto com outras bandas pioneiras do estilo e pavimentou a estrada para o Hardcore Californiano (com o tempo, esse Hardcore foi se distanciando das origens agressivas e se tornando um pouco mais Pop e até influenciando na formação do Pop Punk). Em 1985 a banda lança o álbum “Frankenchrist” com arte feita pelo suíço H.R. Giger que continha desenhos de pênis e vaginas, o que gerou a maior polêmica da banda e o maior processo criminal deles que durou até seu fim 1986. A banda foi processada por distribuição de pornografia a menos -devido a capa- e teve milhares de cópias apreendidas. Isso acirrou ainda mais a debate sobre a livre expressão artísticas nos EUA. Em 1986 a banda lança seu último disco de inéditas “Bedtime For Democracy” e no mesmo ano são absolvidos pela justiça. A banda, já desgastada, acaba e Jello Biafra, já um dos maiores nomes do Punk entra em carreira solo fazendo participações gravações e shows de outras bandas como Offspring, Sepultura e Ratos de Porão, chegando a se apresentar aqui no Brasil com as duas últimas (show que gerou a lenda que ele teria um caso com Renato Russo). Em 1987 sai uma compilação dos maiores sucessos da banda e Biafra processa os outros antigos integrantes alegando que os direitos autorais não foram pagos corretamente. Acontece que essa não foi a última polêmica deles. Ao fazer uma turnê de 40 anos da banda em 2019 com outro vocalista, Skip, eles contrataram o ilustrador Cristiano Suarez (que fez a arte de nosso primeiro EP de 2016) para fazer o poster do show que contia, como sempre, críticas políticas satíricas ao governo brasileiro e foi lançado pela conta oficial da banda na internet. Porém, após críticas de grupos pró-governo, a banda negou conhecimento sobre o poster, mas o artista afirmou que eles sabiam (Cristiano sofre ataques até hoje). O que foi suficiente para Jello Biafra soltar seu humor ácido para criticar a banda.


Dead Kennedys – Police Truck


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