Sophia tem 16 anos, é a filha primogênita de Dalva e Sérgio Brachmans e irmã de Liz. Sophia é muito determinada, criativa, brincalhona e sociável. Sempre gostou de estudar teatro em sua escola. Foi modelo mirim, participou do Concurso Miss Bahia e aos 9 anos atuou no filme "Irmã Dulce" (2014), no papel principal, quando criança. Tudo isso quando, ainda em Salvador, participava das atividades do Habonim Dror.
Como surgiu a vontade de ir para Israel?
Desde sempre tive o sonho de ir para outro país e aprender novas línguas. Sabia que para realizar meus objetivos e sonhos precisava buscar outras oportunidades fora do Brasil. A ideia da Aliá já existia há um tempo, mas não tínhamos colocado em prática. Um dia, meus pais cansaram de me ouvir falar sobre sair do Brasil e começaram a se planejar, foram 2 anos de preparação juntando documentos.
Foi através deste programa que você chegou até lá?
Neste meio tempo, descobri o Naale. Um programa para jovens judeus de todo o mundo, entre o 9° ano e o 1° ano do ensino médio, totalmente subsidiado. Pesquisei, me interessei, e começamos o processo de aceitação no programa, junto com o da Aliá, mas não era tão simples. Além de toda a papelada, precisei passar por vários testes, incluindo: psicoteste, de conhecimentos gerais e entrevista com psicólogo. Foram dois dias inteiros e muitos adolescentes concorrendo para poucas vagas e altas exigências. Mesmo com a incerteza do resultado, meus pais deixaram claro que independente de que se eu passasse ou não, iríamos para Israel. E foi com muita ansiedade e expectativa que recebi a resposta para começar a fazer as malas.
E como vocês ficaram quando receberam a notícia?
Foi um período de preparação, de despedidas, de expectativas e felicidades, mas acredito que no fundo ninguém está realmente preparado para deixar tudo para trás, os costumes, os carinhos, os risos com a família e os amigos e até mesmo as brigas. A verdade era que mesmo eu mostrando total confiança, a ficha não tinha caído ainda. Lembro que faltando uma noite para a viagem, eu estava "brigando brincando" com meus pais e minha irmã, eles queriam que eu fizesse a panqueca que sempre fazia, a discussão era quem deveria fazê-las, foi então que usei o argumento de "vocês que deveriam fazer, e me mimar um pouquinho antes de eu ir". Acho que minha própria frase serviu mais como um choque de realidade do que uma brincadeira, quando me toquei do que disse eu apenas respondi "daqui a pouco eu faço, seus chatos" e sai para o meu quarto. Um forte aperto e um bolo se formou em minha garganta, eu não queria chorar, não tinha chorado até ali, sempre dizendo que ficaria tudo bem para não os preocupar, para mostrar que sabia o que estava fazendo, para estar forte por eles e por mim. No final, jogados no chão entre lágrimas e abraços a realidade bateu na porta. No aeroporto, minha família e amigos foram se despedir, eu não chorei entre os abraços e palavras bonitas de cada um deles, mas guardei tudo no meu coração e com as mais sinceras palavras falei que os amava e distância nenhuma poderia mudar isso. Minha mãe acompanhou-me até São Paulo onde seria o voo junto aos outros participantes, em um determinado momento todos seguiam para o embarque e antes que percebemos, uma fita separava-nos, não tínhamos mais tempo, as palavras ficaram enroladas enquanto chamavam pelo meu nome, tínhamos muito o que dizer, mas apenas um abraço e "eu te amo infinitamente, te ligo " foi o que deu tempo, olhei para frente. Após uma longa e cansativa viagem, cada um seguiu para seu quarto, larguei minhas malas, olhei para as 4 camas, os dois armários e duas escrivaninhas, e então, enfim pude respirar, lá soltei tudo, a felicidade de ter chegado até ali, o medo, a saudade e disse para mim mesma " agora é eu por mim mesma, que venha o futuro "
Quais são as diferenças entre a educação Israelense e a Brasileira?
O Naale, engloba escolas que também são internatos (פנימייות). Moramos, estudamos, temos acesso a saúde, alimentação, mesada e ajuda de custos para transporte para finais de semana e feriados. Tudo é bancado pela escola e o governo além de uma ajuda após o 3° ano. O sistema educacional de Israel tem bastante diferenças em comparação com o do Brasil. Temos matérias extracurriculares que são: química, física, artes, agricultura e diplomacia. Essas podem ser em inglês para os que ainda não falam bem o hebraico. Além de informática, biologia “5 pontos” * história de Israel “5 pontos”, psicologia e mais alguns. Essas são apenas em hebraico.
Outra diferença é o que no Brasil fazemos após o 3° ano em um único dia e uma única prova, o ENEM. Em Israel chamamos de בגרות (bagrut), assim como o ENEM, as בגרוית (plural de bagrut, bagruiot) são de extrema importância para o futuro. Ao mesmo tempo, diferente do ENEM o qual fazemos em um único dia, as bagruiot são ao longo dos anos, a partir do 1° ano do ensino médio fazemos provas e trabalhos de cada matéria as quais as notas vão para o boletim da bagrut, essas notas são de extrema importância para o exército (o qual é obrigatório, já explico melhor), para a área de trabalho e muito mais, e com isso podemos finalizar uma matéria. Por exemplo, terminei Biologia. Com a finalização de todas as matérias e da escola, ganhamos um certificado o qual pode ser usado em universidades de quase o mundo todo. Algumas matérias aqui não são obrigatórias, como química e física, as estudamos, mas sem muita profundidade, mas você pode escolhê-las como matérias extracurriculares. Matemática e inglês são divididos por pontos (níveis). Aqui, se perder em uma matéria ou prova, pode fazer quantas vezes quiser a recuperação até atingir uma nota aceitável. Eles valorizam muito o trabalho árduo, dedicação e força de vontade, um dos motivos o qual mesmo com o pouco de hebraico e inglês que cheguei, após 1 ano de só 30 horas de hebraico, entrei no nível mais baixo e pulei para o מתקדמים o avançando de hebraico. Então em vez de ter mais 1 ano só de hebraico junto a outros olim, tive mais matérias, como história, biologia, literatura, etc, (todas em hebraico). Aqui o exército é obrigatório para todos, com algumas exceções, meninas devem exercer por 2 anos e meninos 3 anos. As notas influenciam muito em que área do exército é o perfil do participante, temos uma diversidade de áreas que se subdividem, tem o combate, aeronáutica, marinha, artes, inteligência, comunicação, investigação, voluntários etc. A lista é bem extensa, para poder participar temos que fazer provas e psicoteste e muito mais, eles avaliam tudo. No exército, você ganha uma mesada e viagens, o exército também é importante para o futuro profissional já que abre mais portas.
Então, significa que Israel oferece boas oportunidades para os imigrantes? Qual a diferença mais marcante para você entre viver em Israel e no Brasil até o momento?
Sim, com certeza. Aliá, o Naale e muitos outros programas incentivam a imigração de judeus, este tem o total apoio do governo que fornece ajuda. Sempre que falo da diferença entre viver aqui em Israel gosto de iniciar pela segurança. Aqui me sinto segura de sair de casa tarde da noite e voltar de madrugada, de andar sozinha com meu celular e ter a certeza de que nada vai acontecer. Minha irmã, Lis, com 7 anos vai sozinha para escola. Outra coisa interessante é que se você esquecer algo, seja um guarda-chuva ou um celular, o objeto permanecerá intocado até que você volte para buscá-lo, eu por exemplo, sou muito esquecida, um dia esqueci meu celular em uma loja a noite e só pude voltar no dia seguinte e quando cheguei ele estava lá bem guardado.
Como tem sido sua adaptação no país, na escola, com a língua/ cultura?
Conte um pouquinho dos seus desafios e conquistas até o momento e claro da chegada de seus pais.
No início tive muita dificuldade principalmente pela falta da língua inglesa e hebraica, cheguei com quase nada, e pela falta de compreensão e comunicação tinha muita dificuldade de me expressar e de entender os madrichim, professores e estudantes. Infelizmente os brasileiros que sabiam não pareciam muito dispostos a ajudar. A saudade era grande, os medos e frustrações em relação à língua e para não deixar esses sentimentos tomarem conta, os estudos eram meu meio de escape, não queria falar com meus pais sobre isso, para não os preocuparem, mas a partir do momento que soube me expressar melhor, meus madrichim foram os que mais me ouviram e me apoiaram. Os estudantes que moram comigo sempre foram muito legais e divertidos e mesmo que não fosse uma amizade forte, nos tornamos uma grande família. Meus pais chegaram 9 meses depois em pleno isolamento, tudo estava fechado, eu estava na casa de amigos de família e só poderia vê-los 1 semana depois, mas faltando 2 dias e disseram que fechariam as estradas e eu estava no centro de Israel e eles no Norte. Apesar das cidades em Israel serem bem próximas umas das outras (é possível chegar em uma cidade do lado em 15 minutos), o problema seria se proibissem a passagem, eu fiquei super preocupada, não queria esperar mais 2 semanas para poder encontrá-los. Estava decidida que nem que fosse andando ou tivesse que pedir para a polícia, eu iria para onde eles estavam (nada disso era possível). No final, consegui chegar antes que fechassem as estradas - não foi andando. De carro mesmo - e foi na noite de Pessach que nos reencontramos, entre lágrimas e abraços toda a saudade, preocupação e medo foram embora. Apesar de todas as dificuldades que passei, desistir nunca foi uma opção e foi durante esse tempo que conheci pessoas maravilhosas, aprendi muitas coisas e me tornei muito mais forte.
Meus madrichim e professores sempre são de grande apoio, estão sempre ali para ajudar, super carinhosos e divertidos. Conheci diversas culturas e pessoas de todo o mundo, até mesmo do Japão e Tailândia. E apesar de todas as diferenças, somos uma grande família aprendendo e se divertindo juntos. Não é fácil, mas com o tempo todos aprendem a como se adaptar a um espaço comum. Com isso, lições muito importantes para a vida e o amadurecimento podem ser aprendidas. Nos divertimos muito, temos brincadeiras, passeios e vários mimos – incluindo o Shabat Sagur quando, uma vez por mês, os alunos do internato ficam na escola e temos um jantar de Shabat especial, onde todos estão bem arrumados para logo em seguida curtirmos uma discoteca! É muito divertido.
Uau! Sophia, quanto relato! Obrigada por compartilhar momentos como estes.
Qual dica você daria para os jovens que têm este objetivo de emigrar?
Para estar aqui, venham com muita força de vontade, dedicação e foco nos seus objetivos. Para estar aqui, venham com a mente aberta para aprender coisas novas, para mudar sua forma de pensar e de agir. Para estar aqui, venham com a cabeça limpa e o coração aberto. Para estar aqui, venham para se divertir muito e aprender muito. Fazer amizades maravilhosas, crescer e aprender, é isso que precisa para estar aqui.
(*)”5 pontos” significa estudo avançado da matéria extracurricular, quase universitário
Parabenizo a Mari pela condução da entrevista e a minha querida sobrinha Sophia, pela imensa determinação em lutar para estender os horizontes e alçar voos incríveis!